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Rio das Sesmarias Junto à Ponte na Abrunheira |
Pelos zambujeiros e oliveiras, abrunheiros e mulatas, cedros
e choupos, caminhos e curvas que começam a ficar debruados de ricos carrascos porque
de muita bolota lhe pesarão, e os silvados que, com a chegada das andorinhas,
coloridos de amoras se hão de encher, que antes, mas mesmo muito antes, foi
território do melro “Simão” e da melra “Micas” que, na idade do Caracol Velho,
sua filha Judite e genro Coutinho que era Bernardino, voavam e controlavam a
zona.
Agora, muitas gerações para a frente, lindos melros, melras e
suas proles, lhes fazem honras e se apresentam em enchentes, quase bandos, chilreando
desde que o Sol desponta nestas terras ao fundo do Caracol, do Peixoto, do João
da Batata, do Azevino e da Arroteia.
Por ali, pela Gago Coutinho que é mesmo Coutinho em homenagem
ao Bernardino da Judite, abeirei-me do nosso amigo Rio das Sesmarias —"bem-aventurado”
confessor e adivinho da nossa Terra que, por estes dias, corre de (barriga)
água cheia com pressa de chegar à Azenha do Ti Sebastião — para nos dizer as
últimas parangonas do jornal da caserna.
Não disse, mas soprou-me que os caixotes do lixo andam muito
remexidos.
— Remexidos?
Interroguei eu! Que quereria o meu amigo dizer? Eu só pensei,
mas ele adivinhou a dúvida, e voltou a soprar-me ainda mais forte que mais
parecia a volta da “nortada”
— Têm umas varetas com um gancho na ponta e remexem… remexem…
até encontrarem alguma coisa que se coma.
— O quê, será que percebi bem?
E pela “nortada” insistiu
— Sim! Percebeste bem, sim! Andam à procura de comer. Naturalmente
que sempre acabam por ir outras coisas que as pessoas atiram para o lixo, mas é a necessidade de encher a
barriguinha, que os leva a procurar nos caixotes aquilo que não têm nas
despensas.
Aí, certificando-me que não havia mais ninguém por perto,
perguntei em voz alta:
— Oh! Meu amigo Rio das Sesmarias, partindo do princípio de que
me entendes bem, diz-me: São sempre os mesmos? E quantos são?
— Alguns vêm sempre de manhã cedo e ao lusco-fusco, outros
vêm às vezes e, há uma mulher também. Esta, muito vestida e quase toda tapada,
é difícil ver-se-lhe o rosto.
— Uma mulher? Pois é Amigo Rio das Sesmarias, são tempos de
pobreza e muita, é envergonhada.
— Juro, por esta água que há de chegar à costa do Estoril em
São Pedro, que nem no tempo do Caracol Velho, do Simão e da Micas, havia assim
tanta pobreza de comidinha.
— Tens razão Amigo, a pobreza era outra. Mesmo assim, para
comida e outras coisas de primeira necessidade, hoje há alternativas aos
caixotes do lixo. As famílias com estas carências podem contactar a Junta de
Freguesia em São Pedro pelo telefone 219 105 810, em Sintra 219 100 390
ou mail: acaosocial@uniaodasfreguesias-sintra.pt
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O meu Amigo Rio das Sesmarias, ficou confortável com esta
dica e agora corre bem cheiinho direito à Azenha que já foi do Ti Sebastião (moleiro).
Silvestre Brandão Félix
26 de fevereiro de 2021