terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

URCA – E A SUA MATRIZ CULTURAL

Depois daquele período inicial da URCA, inigualável na forma e no contudo, com entusiasmo desmedido e vontade de querer fazer sempre mais, entendendo ser a forma de se recuperar o tempo perdido, houve duas fases muito marcantes na vida da coletividade e da Abrunheira: A apresentação da obra de Miguel Barbosa “O Palheiro” pelo GITU, com direção, encenação, cenografia e tudo o mais necessário de Gil Matias, estreado em 1979, e o encontro de Grupos Corais Alentejanos, salvo erro, em 1983, organizado pelo Grupo Coral Alentejano da URCA.

Para entender alguns acontecimentos é necessário contextualizá-los. Nos finais da década de 70 e princípios da de 80, cerca de 60% da população da Abrunheira era de origem alentejana. As razões sociológicas desta movimentação de famílias inteiras do interior para o litoral são do conhecimento geral, a que não é alheia a procura de melhores condições de vida com a industrialização da nossa região. Para laborar nas fábricas que iam aqui nascendo como cogumelos, era necessária mão-de-obra e, com a vinda dos primeiros no início da década de sessenta, logo outros foram chamados até que a Abrunheira mudou, até na maneira de falar. Dizia-se, na altura, que a Vila alentejana do Alvito se tinha transferido para a Abrunheira. Naturalmente que, dizendo isso se pecava pelo exagero, hoje, no início da segunda década do século XXI, há alturas do ano em que a Abrunheira se transfere para Alvito. Ou seja, estas duas Terras enriqueceram-se mutuamente.

Voltando ao Encontro de Grupos Corais Alentejanos de 1983, eu na altura não estava em Portugal e por isso não assisti a este, só aos posteriores, mas pelos relatos que li e ouvi e pelas fotos, foi, pela quantidade e qualidade de Grupos presentes, um acontecimento impar na história cultural da nossa Terra.

O êxito da apresentação de “O Palheiro” foi, acima de tudo, uma aposta arrojada do Gil Matias. A experiência dos componentes do GITU era “autodidata” e, mesmo assim, havia necessidade de recrutar muitos mais elementos. Cada reunião, cada ensaio, eram autênticas lições sobre a arte de representar. Gil Matias foi encenador, diretor, professor, Pai, irmão e sei lá mais o quê. Mais de metade do ano de 1978 foi necessário para dar corpo ao espectáculo. A peça é grande e a criação das personagens muito trabalhosa. Não foram poucas as vezes que tudo esteve quase a parar mas, com a nossa vontade e com a coragem e sabedoria do Gil Matias, lá conseguimos chegar ao dia do ensaio geral. Os nervos eram muitos na estreia. Sentados na plateia, estavam “olheiros” importantes e a população da Abrunheira em peso.

Fomos selecionados e concorremos ao Festival de Teatro Amador do Concelho de Sintra em 1979 e ficamos nos primeiros lugares. Lembro-me de termos representado a peça, para além das duas vezes na URCA, em várias locais dos Concelhos de Sintra, Cascais, Oeiras e Mafra. Esteve em cena todo o ano de 1979 e parte de 1980 e foi o grande sucesso do GITU. Era a consagração da motivação cultural da nossa coletividade e da nossa Terra. O Gil Matias continuou a colaborar com a URCA durante mais algum tempo, dando lugar depois a outras pessoas.

Miguel Barbosa, que recentemente doou ao Museu de História Natural de Sintra o seu espólio arqueológico recolhido ao longo de mais de quarenta anos de que fazem parte peças e fósseis únicos no mundo, é autor de uma vasta obra literária nas várias especialidades, a saber: Mais de trinta títulos de poesia editados em português, Italiano, Francês e Inglês; cinco novelas em Portugal e nos Estados Unidos; oito contos em português; mais de uma dezena de romances policiais com o pseudómino de Rusty Brown e três romances com o pseudómino de J. Penha Brava e participação em mais de cinquenta revistas literárias em Portugal, Brasil, Estados Unidos, França, Itália, Inglaterra, etc., etc.. A sua biografia preenche muitas páginas com referências a todos os cantos do mundo e, bem lá no meio, referindo-se à peça “O Palheiro” e aos grupos que a representaram: «“O Palheiro” foi representado pelos… (vários grupos) e pelo GRUPO DE INTERVENÇÃO TEATRAL DA URCA (ABRUNHEIRA), SINTRA».

Também esta circunstância é motivo do nosso orgulho!

Silvestre Félix

3 comentários:

  1. É lá...não sabia destes factos sobre o Miguel Barbosa?Quem diria...
    escreve tudo, amigo...Já ando a aprender qualquer coisa que não sabia....
    o Luis Peniche acha que deviamos voltar a apegar na peça de teatro e representá-la outra vez...
    O Palheiro II....está actual...digo eu...
    Abraço

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  2. Miguel Barbosa, modesto no ser e no parecer, tem uma obra imensa e, digo eu, pouco conhecida em Portugal.

    Ele vive no nosso Concelho e o Museu de História Natural de Sintra foi inaugurado em Agosto de 2009 com a apresentação do espólio que ele ofereceu. Ele não é arqueólogo mas, movido pela curiosidade e aproveitando os tempos das suas viagens pelo mundo, foi colecionando autênticas relíquias.

    Gostava de ver "O Palheiro" em cena. É verdade que o texto é intemporal, pelo menos, até este "tempo".

    No entanto, a Abrunheira, de preferência no seio da URCA, precisa de utilizar ferramentas atuais para o desenvolvimento cultural. O teatro pode ser uma das valências.

    Abração
    Silvestre Félix

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  3. Olá Silvestre,
    Acho que o Luis Peniche tem razão, essa ideia de pegarem na peça de teatro e representá-la novamente, é muito boa, diria mesmo espetacular.
    Acredito que deve ter sido um trabalho muito bom e gostava de poder apreciar, já que nessa altura eu não vivia cá, estava lá para os lados de Alvito. Vocês deviam mesmo pensar nisso!
    Beijinhos pessoal das artes :-)))))

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