segunda-feira, 3 de julho de 2017

DAR-DE-FROSQUES, FIM DO IMPÉRIO E AS ELEIÇÕES


Na época em que, a expressão; "a sério", era mesmo sério e não admitia confusões, “O Século” do Ti Álvaro, trazia notícias da Guerra do Vietname e doutras, mas, da Guerra em Angola; nada! Era um caso sério. Havia alguns que, de miudinho e baixinho, falavam da guerra “nas Áfricas”.  O azul do lápis, ia cumprindo a sua missão sensória. Riscava, cortava e, se preciso fosse, convocava o destemido autor do escrito e ameaçava-o com uma visita acompanhada ao “Resort” da António Maria Cardoso. Daí que, de “guerra”, só do Vietname se podia ler no “O Século” do Ti Álvaro.

Associarei sempre a minha aprendizagem de leitura “a sério”, ao jornal “O Século” do Ti Álvaro e às notícias que ele deixava que eu lesse, de joelhos, no banco verde corrido e debruçado sobre o tampo da mesa em mármore. Lia e ganhava o receio da guerra, porque ouvia em surdina; «vai acabar antes de eu ir p’ra tropa».

A Ti Augusta sossegava-me.

— Ainda falta muito tempo! Quando fores p’ra tropa, já não há guerra “nas áfricas”.

Sentia-me melhor pela segurança que a minha Mãe sempre me transmitia.    

A meio da leitura, sempre sentia por perto o Ti Hilário. Com a Ti Natália na labuta, lá se aventurava a um copinho-de-dois. Seria branco, tinto, dois ou de três, ou um bagacito? A minha memória também não vai apurada tão longe. Até posso inventar um bocadinho. Não será pela quantidade ou qualidade da bebida, que me hão de levar a mal. O fato-macaco, tenho a certeza que era azul e sempre borrifado de cimento ou estuque. Restos e sinais da última obra de trabalho afincado.

Pois é! Mas eu sabia que no “O Século” do Ti Álvaro, não vinham todas as notícias. Então e os “aerogramas” que o meu Primo Xico mandava da Guiné? Era eu que os lia à minha Tia Ermelinda e, por isso, sabia muito mais coisas, do que vinha no jornal. O Xico disfarçava no que escrevia, mas eu percebi sempre que a coisa nunca foi fácil; era guerra “a sério”! Depois do “soro” bem espremido e os queijinhos todos dentro dos cinchos, a minha Tia Ermelinda ditava a resposta. Claro, a maior parte do texto era sempre igual e eu adiantava-me. Para o final, “lavada” em lágrimas, lá me ditava o que lhe ia na alma.

A sério, naquele tempo em que lia notícias da Guerra do Vietname no “O Século” do Ti Álvaro, não havia opção ao que configurava, estar “a bem com a nação”. A alternativa era “saltar”. Aqui, o “saltar” não tinha nada a ver com “saltar-à-corda” ou “saltar-ao-eixo”. Era ir embora, “dar-de-frosques”, “ir à vida”, enfim; emigrar clandestinamente.

A sério! Clandestinamente porque para atravessar a fronteira e pôr o pezinho em Espanha, era preciso passaporte e, para se conseguir, era o “cabo dos trabalhos” e a PIDE não brincava em serviço. Ou bem que era ditadura “a sério”, ou então, que acelerassem o “25 de abril”.  

A sério! Se saltássemos cinquenta e muitos de tempo contado em anos p’ra frente, com água sempre a correr na bica do chafariz e no Rio das Sesmarias por debaixo da “Ponte da Colónia”, seria “à séria”! Sim, agora, cá à frente, depois da troika, da deflação, dos cortes nos ordenados, nas pensões, nos subsídios de férias e de Natal, virou moda adjetivar esta expressão no feminino.

Mas porque agora se diz, “à séria” e não, “a sério”?

Procurei em todos os “cantinhos”, mas não tem nada a ver com o acordo ortográfico.

Provavelmente, alguns dos que defendem uma “cruzada”, “à séria”, contra o acordo, ficariam satisfeitos se voltássemos a escrever “pharmácia” em vez de “farmácia”, mas, esta coisa anda para a frente e já não temos “império”, quanto mais propriedade da “língua”. A língua é património dos falantes e não de nenhum país em particular. É curioso saber que, por exemplo, alguns brasileiros também são contra o acordo. Na maioria dos casos, as razões são as mesmas, só que, ao contrário.

Bem, deixemo-nos de acordos e desacordos, e bem guardadinho numa prateleira da memória, “O Século” do Ti Álvaro e, agora, a “sério”, lembremo-nos que estamos a caminhar rapidamente para mais uma ida às “urnas”.

Terão os abrunhenses condições e vontade para avaliar a “seriedade” dos candidatos que se vão propor?

Saberão os abrunhenses quem são, donde vêm e que capacidade têm para fazerem aquilo que prometem?

Estarão os abrunhenses dispostos a dar o voto e uma palmada nas costas a quem nunca lhes deu nada?

Votarão os abrunhenses em “listas” elaboradas, só, segundo critérios partidários, sem que, as suas necessidades e a sua opinião, sejam levadas em conta?

Gostarão os abrunhenses de tornarem a votar numa “união” de freguesias descaracterizada e incapaz de se aproximar do “Freguês”, em vez de escolher o seu Órgão Autárquico de proximidade; a Junta de Freguesia de São Pedro de Penaferrim?

A “sério” que não é difícil responder a todas estas perguntas. A agregação destas três freguesias levada a cabo pelo anterior governo do PSD/CDS e votada em Assembleia Municipal, é uma autêntica aberração. Admito que, em vez de três, com alterações aos limites anteriormente existentes, pudessem passar a ser duas. Agora, assim, como foi, não!

O que mais me “engalinha”, a “sério”, é não ter sido feito nada para corrigir a situação a tempo das próximas eleições.

Silvestre Félix
3 de julho de 2017

Tags: Abrunheira, Ti Álvaro

quarta-feira, 30 de novembro de 2016

SÃO PEDRO DE PENAFERRIM E A DESAGREGAÇÃO

A agregação de freguesias, levada a cabo pelo anterior governo, e com efeito já nas últimas eleições autárquicas de 2013, terá resolvido e melhorado situações pontuais, mas, por outro lado, complicado e piorado ao extremo, muitas mais.

A minha, onde nasci e resido, São Pedro de Penaferrim, num processo de avanços e recuos, compromissos, descompromissos e algumas traições, acabou por ficar agregada com a de São Martinho e a de Santa Maria-São Miguel, a que chamaram: União das Freguesias de Sintra.

Foi tal a obra, que fizeram uma freguesia maior, que uma parte considerável dos concelhos existentes no país. Mesmo aqui na zona, será maior que o de Oeiras, Amadora ou Odivelas.

Do Barrunchal a Janas, pelo trajeto médio mais direto e mais utilizado, percorremos cerca de 20 quilómetros e, durante um dia de semana, ou seja, excluindo as horas de ponta e os fins-de-semana, demoramos cerca de meia-hora.

Com um órgão, a Junta de Freguesia, assente nos mesmos pressupostos que contava cada uma das três agregadas, era previsível, que muito difícil seria corresponder ao conhecido mérito do “poder de proximidade”, com tudo o que isso implica.    

Os esforços e vontades podem ser inglórios quando o terreno conquistado é pantanoso e não se arranja forma de o secar. A insatisfação das populações não se esbate com promessas impossíveis de cumprir.

Para que os fregueses destas três freguesias de Sintra, voltem a sentir a proximidade do poder com segurança e confiança na democracia, é imperativo que se desagreguem e, a seguir, quanto muito, se corrijam e ajustem limites atualizados.

Estamos todos ansiosos por perceber a atitude de cada uma das forças políticas e partidárias, face à proximidade das eleições autárquicas.

Silvestre Félix
30.11.2016
Tag: Freguesia de São Pedro de Penaferrim

Foto: Google

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

MERCADO DE SÃO PEDRO

Ao mercado de São Pedro, por esses caminhos acima, íamos. Sim! No pretérito. Agora não é possível; porque caminhos já não os há e, mesmo que “por obra e graça do espírito-santo”, algum se descortinasse, de nada serviria porque “mercado” virou “feira” e, mesmo assim, oiço e leio por aí, que está a definhar.

Que tudo evolui, dizem uns; que tudo acaba ou que acabam com tudo, dizem outros. Dizem até, uns inteligentes, que desenterrando a calçada e virando piso lajado, muitos lugares marcados e pilaretes montados, arrumariam a invasão de andantes que ali aparecem e ficava bem a Praça D. Fernando II, a da feira e de outros eventos encomendados.

Do mercado querem saber as gentes da Freguesia de São Pedro, este, de Penaferrim. O mercado para onde, por esses caminhos acima, íamos. Eu e a minha mãe, e outras mães e filhos que primeiro víamos os sapatos, as botas, a correnteza dos fatos, as sementes e hortaliças, os burros, as vacas vitelas e vitelos, as ovelhas, os bácoros… víamos, porque para compras a féria era curta, e, depois, talvez um bolo saloio ou umas queijadas das mais baratas.

Os caminhos por aí acima eclipsaram-se e o mercado, que agora é feira, a continuar assim, virará depósito de carros e, quem sabe, rodeada de “caça-níqueis” nas entradas e saídas.

Não tarda nada, virão as promessas e as juras do seu cumprimento, se os fregueses fizerem muitas cruzinhas à frente dos seus nomes. Mas então? E antes, como foi? Porque não cumpriram e porque é que o mercado, já era?

Abrunheira, 16 setembro de 2016


Silvestre Félix   

segunda-feira, 30 de novembro de 2015

TEMPO DE (DEPRIMENTE) NOVEMBRO


Neste deprimente novembro, como, aliás, todos os outros que têm vinte e cinco e desde que eu tinha vinte e um em anos contados, que, quase no fim (o novembro) mas ainda andando por aí algumas horas, oiço coisas feitas lamechices completamente deslocadas em dia de cimeira de ambiente e em tempo de carência e necessidades básicas dos refugiados que batem à porta duma Europa que foi assobiando para o lado e, quando acordou e deixou cair o assobio, viu-se tolhida de movimentos e soluções (como é costume)…

Lamechices eu ouvi, perto de mim, em lugar público, usando, alguém, topo de gama auditivo na escuta:

«— Não! Não! Não posso andar de “cavalo p’ra burro”!

(tempo de resposta inaudível, para que está do outro lado)

— Sim! O carro é ótimo, mas a carrinha que ele me atribuiu o ano passado, a que tenho agora, tem sete lugares!

(Resposta inaudível)

— Sim! Eu sei! Mas, neste caso eu valorizo o tamanho. Se fosse anual mas para dois anos… agora tenho dois filhos, mas para o ano posso ter três. E depois, tenho que que arranjar particularmente um carro maior?

(Resposta inaudível)

— Achas que devo aceitar? Sim, ao carro não lhe falta nada do que é a última tecnologia. Se quiser, até posso trabalhar no carro.»

Não ouvi mais porque o elemento teve a acertada ideia de se desviar do local onde eu estava sentendinho…  

Nestes dias de deprimente novembro, que, para mim, sempre é, têm-se falado muito das dúvidas sobre o aumento do ordenado mínimo até 600 euros em 2019. Pois………..

Silvestre Félix

30 de (deprimente) novembro de 2015   

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

BOM SENSO





Uma parte dos que militaram nas fileiras dos vencedores em 25 de novembro de 1975, não conseguiram terminar a missão a que se tinham proposto — fazer recuar o País a 24 de abril de 1974.

O poder, no essencial, ficou com os moderados e, por isso, ficou-lhes atravessado a meia-vitória ou meia-derrota naquele 25 de novembro.

Quarenta anos depois, embora alguns “originais” tenham desaparecido e outros estejam em vias disso, deixaram sementes a germinar por aí e, ainda neste outubro e novembro, de plantinhas nascidas com as primeiras águas, com toque veludo e bem cheirosas, viraram agressivas e pestilentas, tirando todas as garras de fora e arranhando em todas as direções e por tudo quanto lhes “cheirou” a democracia.

Mais uma vez, não conseguiram os seus intentos. Decerto não desistiram e, lá para a frente, outras tentativas farão.

Os portugueses estarão alerta!

Por agora, o bom senso venceu!

Silvestre Félix
25 de novembro de 2015














domingo, 4 de outubro de 2015

O dia já vai por-aí-fora...


O dia já vai “por-aí-fora”. O que se estará a passar dentro das caixinhas pretas onde vão depositando aqueles papelinhos, dobrados em quatro, com figurinhas com cruzinha acrescentada?
Será que se estão emparelhando ou, antes pelo contrário?
Se calhar, enfileirando-se estão, não vá o diabo tecê-las e ficarem para trás.
Em dias como este todos querem ir na frente.
Dentro das caixinhas pretas; se tocam, se roçam, se torcem, se miram, se abraçam, se… qual bacanal em dia cinzento enevoado.
Quando abrirem as caixinhas pretas e começarem a separar os papelinhos, ainda dobrados em quatro mas depois desdobrados e empilhados por figurinhas, a faladura vai continuar!
Silvestre Félix
4 de outubro de 2015
Tags: Eleições

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

BEM-FALANTES!

Neste domingo, mais uma vez, o Largo do Chafariz vai ser caminho para os “Abrunhenses” exercerem o seu direito de voto. Por aqui, pelo "largo" que deveria ser a sala de visitas da "Nossa-Terra", passaremos e, se possível for, porque de tão mal-habituados estamos, nem conta damos do desprezo a que votado está o "Nosso-Monumento".

O Bento o diz e o (Chafariz) tem mostrado pelo tempo em anos contado e, em conclusão dorida, a força do voto parido na madrugada de "Depois-do-Adeus", abençoado pela "Vila-Morena" e sonhando que "O-Povo-Unido-Jamais-Ser(ia)á-Vencido", nada resolverá!

Alguns gostariam que caminho deixasse de ser, e, antes, fosse plateia de bom e sossegado ouvido. Assim, continuariam a "papaguiar" agora, como outros já fizeram noutras "Eras-Bem-Aventuradas". Ter presente a história e lembrarmos as estórias que ouvimos dos mais velhos, é muito bom e aconselha-se.  

"“Gabiru-aperaltado”; dizia dele, a vizinhança. A faladura era de “lorde” e dos bons, muito perto do jeito a doutor. Com os adjetivos e os verbos bem encaixados nas frases bem construídas, lá caminhava o discurso por direções, na maior parte das vezes, já conhecidas. Bem arreado ou aperaltado à moda de Saloio com carteira composta. De jaqueta castanha com corrente dependurada pela direita da abotoadura no colete justinho em fazenda cinzenta, camisa alva e colarinho bem apertado, calça cinzenta de cós bem subido e com bainha larga acompanhando a bota pela frente e o respetivo chapéu de aba larga e preto. A posição de descanso e descontração a preceito implicava os polegares das duas mãos bem firmes na dobra da jaqueta, à frente, nos extremos do peito. A compor a arreadura, aquele bigode, mais para o grosso que para o fino, transbordando o comprimento da beiça de cima, como naquele tempo era uso."

Na época “daquela senhora”, a personagem descrita existia em todas as terras saloias e, também, na Abrunheira. Seria o “bem-falante”, e aquele, a quem, os iletrados tudo perguntavam.

Era um tempo em que, literalmente, se enfiava o barrete saloio ou se armadilhavam grandes chapeladas. Na ignorância mantida e fomentada pelo regime do “botas”, não era difícil enfiar umas “patranhas” na saloiada. O boletim de voto era especialmente enviado para o domicílio e muitas vezes até entregue em mão pelo ocupante do “assento-de-proximidade”. De costas para o balcão, ainda que ligeiramente apoiado, aperaltado como de costume e botando faladura como vinha nos jornais devidamente visados pelos do lápis-azul, o “bem-falante” comentava as contrariedades das condições atmosféricas – naquele tempo em que tudo caía em cima do “cinzento,” porque a claridade e o Sol era só para alguns e todos sabiam disso.

Sabiam, os que reagiram e lutaram com, e, pelo General-Sem-Medo, nas revoltas das colónias indianas e africanas, na revolta do quartel de Beja ou no desvio do “Santa Maria”, protagonizavam o descontentamento militar, a luta dos Partidos clandestinos, etc., etc., – e, porque também sabia, e de que maneira, interroga-se ele, o “bem-falante”, aos presentes; como iria ser a próxima safra do Sabino, do Silvestre Velho, do Veríssimo, do Frouxo ou do João de Leião?

Todas as sessões propagandísticas; fossem no Largo do Chafariz ou numa das tabernas da Abrunheira no terceiro quartel do século XX, ou num qualquer multiusos no XXI, ouvidas pelos tais que sabem e pelos que não sabem, mais do que menos, cheiram a pantominice. Melhor fora que o espetáculo fosse dos saltimbancos. Porque, assim, o pouco que tinham era o que davam e ninguém lhes exigia mais. 

Muitas vezes, os saltimbancos, pelo Largo do Chafariz passearam a sua boa disposição e, os abrunhenses, viram e admiraram a forma como encaravam e levavam a vida que sempre melhor ficava pelos tempos difíceis que corriam, ao contrário de, cá mais para a frente do ano dois mil e poucos, que pior está, para os vivos e até para os mortos.

No “quinze” deste século XXI, muitos vão “parlapiando” para os “assentos-distantes” do povo, mas pelo Largo do Chafariz é que eu nunca os vejo. Para “mal dos nossos pecados”, é cada vez mais difícil que, os que se vão lá sentar, alguma vez venham a passar pelo Largo do Chafariz. Muito longe vão ficar as cadeiras e como entramos no Outono, os dias vão ser mais pequenos, deixando menos “luz” para os que se aventurarem a gastar as solas dos sapatos a caminho, pelo Largo do Chafariz, das mesas de voto.

Muitos burocratas e “bem-falantes”, promotores de detentores, detentores ou candidatos aos “assentos”, gostariam, e muito se esforçam, para voltarem a um certo modelo bafiento. Têm treinado há algum tempo e agora estão mais preparados para levarem a deles avante.

Para os que se sentarão nos “assentos” a partir de 5 de outubro, que, desgraçadamente até lhe tiraram o simbolismo, o “papaguiamento” continuará a ser – a missão! É preciso continuar a usar e abusar de “faladura” para o Zé continuar convencido, mesmo que os euros no bolso sejam poucos.

Silvestre Félix

Abrunheira, 2 de outubro de 2015


Tags: Abrunheira, Largo do Chafariz, Eleições