sábado, 29 de janeiro de 2011

O CONTADOR DE CENAS

Ficam contadas em duas, as vezes que, depois de publicada esta no “Largo do Chafariz”, eu aqui falo da personagem mais inspiradora que nalgum tempo eu conheci na Abrunheira, que é uma Terra com História e cheia de Histórias.

Pois então aqui deito uma das prosas inspiradas no sapateiro e contador de cenas, cegadas, bailes, arraiais e outros que tais, de nome Joaquim mas dito e conhecido por: J’quim Cagachuva agarrado pelas leis do matrimónio à Margarida Cagachuva que de tudo o que se passava na Abrunheira e arredores sabia, como de profissão exercesse equiparada a uma boa repórter ou enviada especial nestes anos, em tempo contado vão onze do século vinte e um. Que de vocação pouca tenho, aqui lhe traço rimado o perfil: De namoricos e cornaduras/Era o jeito e especialidade/Mas de intrigas e benzeduras/E alguma dose de maldade/Se fazia de ternuras/Velha gaiteira daquela idade. À alcunha, não lhe conheço confirmação absoluta, mas com tão óbvia oralidade, e se bem usado o Português-Língua-Mãe-de-Camões, com ou sem acordo ortográfico que aqui não colhe, bem fácil fica adivinhar porque tal apelido lhe acrescentaram.

Sapateiro é Arte de quem faz ou arranja sapatos, de onde lhe pariu o nome, mas também botas, polainas, sandálias, chinelos e todas as outras coisas onde metemos os pés. Agora, neste tempo de shopping’s e outros parecidos, já não sei se há Sapateiros e não há Arte ou se não há Sapateiros nem há Arte para fazer sapatos, botas, polainas, chinelos e todas as outras coisas onde metemos os pés, porque Sapateiros que fazem chaves, carimbos e cartões de visita e dizem que concertam calçado, tudo ao mesmo tempo, não podem ser Artistas de Sapateiro.

O “J’quim Cagachuva” era universalmente conhecido. O “universalmente” está bem metido porque, quando era mais novo, este Artista ainda desgarrado e liberto da faladeira “Margarida Cagachuva”, andava de terra em terra porque naquele tempo não era o sapato ou bota que ia ter com o Artista Sapateiro, mas sim o Artista Sapateiro que ia ao encontro das botas, polainas, sapatos, chinelos, sandálias e outras coisas onde se metem os pés. É verdade, O Ti J’quim, mesmo coxeando da perna nascida desigual da outra, metia-se ao caminho desde o Linhó, que acho era onde tinha morada fixa em solteiro, e direitinho às Casas Grandes dos lavradores para aplicar a sua Arte no calçado dos patrões e dos trabalhadores. E então, lá ia o Ti J’quim pela Ribeira da Penha Longa, Alcabideche, Alcoitão, Bicesse , Amoreira, Manique de Baixo e de Cima, Trajouce, Abóboda, Cabra Figa, Albarraque, Abrunheira, etc, etc. Por todas estas andanças, muitas histórias foram acontecendo a este Contador de Cenas.

E das histórias gostava eu, que quando lá ia ter com ele, não me levava a preocupação de engraxar os sapatos. “Bom dia Ti J’quim, então como é que vai isso?? Vai bem…,” dizia ele e nunca se esquecia de… “Há por ai um cigarrito??” E então começava o ritual. Punha o cigarro nos lábios grossos e babados, pedia lume e, depois do cigarro aceso e daquela conversa em jeito de introdução, … vai chover… não vai chover…. Tá um calor dos diabos… tá bom pás batatas… tá bom pós nabos…., lá vinha, a propósito de um destes temas, lá vinha dizia eu, a invariável expressão; “’m’ocasião…” e pronto, estava dado o mote para mais uma história aí com 40 anos ou mais, e passada numa das Terras por onde o “Ti J’quim” andava; Alcoitão, Bicesse, Manique, etc, o local de ação era sempre a sociedade lá do sítio e a cena era de diversão, nunca de trabalho. A ocasião era o bailarico, e acabava em sessão de porrada e “jogo do pau” com história de mulher pelo meio.

As histórias eram intermináveis, porque este Artista Sapateiro e Contador de Cenas, fazia jus a esta última vertente, e, se fosse preciso, ligava uma à outra e nunca mais acabava, e o cigarro ardia, ardia… e o “Ti J’quim” contava, contava, até que o cigarro se apagava e ficava como se dali fizesse parte.

Ele, O Contador de Cenas e Histórias, porque tinha necessidade de falar recordando o tempo passado contado em anos que nem Ele muitas das vezes já sabia, e eu, porque as imaginava à minha maneira como se fossem de quadradinhos, e por ali ficava tempo passado em horas, porque quando ia lá visitar o “Ti J’quim” não me levava a preocupação de engraxar ou arranjar os sapatos.

A Abrunheira é uma Terra com história e estes são os seus personagens.
«««««»»»»»

(Extraído dos textos “Abrunheira, Terra com História” de Silvestre Brandão Félix, publicados no extinto blogue “Aldeia Viva” durante 2007 e 2008.)
(Correção e atualização do autor em 2011)

Silvestre Félix
29 de Janeiro de 2011

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

DE VOLTA A CASA

Bom da cabeça não pode estar quem – com todas as atrativas alternativas deste mundo e de falta de publicidade ninguém se queixa, antes pelo contrário – não aceita a oferta nacional, muito perto de casa, de alojamento para seis noites em regime de pensão completa, a preço de saldo em última rebaixa mas de muito boa qualidade, incluindo programa variado com calendário previamente estabelecido de aventuras e desventuras: passeios por corredores infindáveis de luz branca mas daquela mesmo muito branca, workshops sobre o comportamento humano em generosidade e na capacidade de sofrimento, experiências inimitáveis de sonos acompanhados com os sons dos mais originais que há – só possíveis em unidades deste tipo – com sequências de triliões de imagens devidamente compactadas e catalogadas incomparavelmente mais eficazes do que qualquer PS, provas de compostos e complementos alimentares na forma líquida e sólida de eficácia amplamente comprovada, utilização de SPA em regime privativo nos banhos e noutras aplicações com o acompanhamento permanente dos mais qualificados profissionais.

Com a oferta descrita, não perdi tempo e lá fui o mais depressa que pude, faz precisamente hoje, oito dias. Estou de regresso aos meus, à minha casa e, principalmente, à minha cama.

Aconteceu sempre, e penso que o mesmo sucede com a maioria das pessoas, que ao longo da vida nas ausências em trabalho, às vezes prolongadas, estabelecia uma espetativa da receção quando a casa voltava. É claro que também tinha que contribuir para isso, por exemplo: A prendinha ou recordação que se trazia deste ou daquele sítio, deste ou daquele aeroporto, e a duração da viagem.

Desta vez, também quis fazer da mesma maneira.

Na passada Sexta-Feira, lá pelo final do dia, depois de uma viagem de corredor com ida e volta, em que as florescentes do teto tomam maior velocidade que nós e em que fica sempre de fora, entre a partida e a chegada, determinado tempo contado em horas, belisquei-me nalguns sítios, abri bem os olhos, tentei salivar e senti uma das ferramentas da aventura bem enfiada pela goela abaixo. Conforme o manual de instruções, é nessa altura que se confirma o sucesso da primeira aventura.

Então, superada esta primeira, outras se seguirão e, na volta a casa, quando a porta se abrir, quem vai estar lá para me receber? A Isabel e a Sofia estiveram comigo todos os dias, Bruno alguns, mas já não mora lá. Já não pode ser igual. Os putos cresceram e não vou chegar sozinho e mesmo que o quisesse não era possível. Os programas, essencialmente físicos, condicionam uma boa percentagem da mobilidade. O único personagem da história que permaneceu sempre em casa e, pelo que me contaram, demonstrou desagrado todos os dias pela minha ausência, foi o Sunny Cat. Esse mesmo! É a ele que vou exigir o cumprimento do protocolo de receção. É inflexível nos seus quereres e agora chegou a sua vez. Assim foi, entrei em casa e, mal deu pela minha presença e sem lhe dizer nada, manifestou logo a sua satisfação com uma miadela adequada à circunstância, e roçadelas infindáveis pelas pernas, entremeadas de mios e lambidelas mas mãos a que correspondi com a mesma emoção. Só não pude aceitar aos pedidos constantes de brincadeira que, prometo, serão devidamente compensados a seu tempo.

Aqui estou, enriquecido, não na conta bancária, mas em experiência e saber, com o coração a transbordar de gratidão pela forma como todos os profissionais me acompanharam nesta estalagem de mobiliário branco, cortado, aqui e ali, pelo tom prata da moda.
Muito Obrigado

Silvestre Félix
27 de Janeiro de 2011
Tags: Hospital Fernando da Fonseca

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A PROPÓSITO DA FUNDAÇÃO DA URCA

A propósito da Fundação da URCA, o José Carmo Silva, destacado elemento dos que, ativamente, criaram condições para o nascimento da URCA e que viria a ser o seu primeiro Presidente de Direção, fez-me chegar um texto que enquadra, acima de tudo, o sentimento de solidariedade comunitária dos jovens da época. É verdade que víamos para além das competências da URCA. A ideia do Centro Social, que era um objetivo concretizável na altura, é a maior prova disso.

“Um aspecto curioso que suportou a formação da URCA, mostra-nos como um conjunto diverso de pequenos "nadas" podem levar à criação de algo que tem perdurado ao longo de todos estes anos.A história da URCA assenta na junção de grupos de jovens, que acabavam por conviver em separado, com visões distintas mas que, talvez de modo inconsciente, partilhavam a necessidade de construir algo que pudesse servir, não só o grupo onde conviviam, mas uma comunidade mais alargada.
Existia por um lado a experiência do Grupo Desportivo, por outro o associativismo já pós 25 de Abril dos mais jovens, ainda grupos mais "maduros" que de vez em quando organizavam os tradicionais bailaricos, e pelo meio as experiências mais ou menos culturais que remontam ao grupo do Algueirão, JURA, (Juventude Unida e Recreativa do Algueirão - cujo padre da paróquia comparou com H2SO4) com antecedentes a 1973 (ou mesmo antes).Jovens em separado, ideais diferentes, mas a necessidade de fazer algo mais grandioso.
Talvez um bom exemplo de "O todo é maior que a soma das partes" e também menor, acrescento eu, por obrigar a alguma perda de individualidade a favor de um objectivo mais abrangente.É esta humildade e grandeza que permitiu cultivar a persistência, permitindo ultrapassar os desafios que necessariamente teriam de surgir.
[José Carmo Silva]”

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

FUNDAÇÃO DA URCA – CAPÍTULO II – 1ª PARTE - DEPOIS DE 3 DE JANEIRO DE 1975

A Assembleia de Fundação em 3 de Janeiro de 1975 foi bastante concorrida. Presentes, vários membros do antigo Grupo Desportivo todos mais velhos do que nós. Eram, digamos, os irmãos mais velhos. Lembro-me, por exemplo, do António Nascimento e do Francisco Cruz. Estavam mais, mas não consigo recordar-me dos nomes.

Este foi um dia importante para a história contemporânea da Abrunheira, e, por isso, devia ser assinalado com alguma dignidade. Durante muitos anos a data foi comemorada como merecia, mas depois, a negligência e o descuido (pelo menos) foram tomando conta de algumas agendas e, com alívio de alguns, perdeu-se o hábito. Para quem não conhece a época e as circunstâncias, é importante que se saiba que o Sócio da URCA, ou melhor, a Sócia registada naquele dia com o número um, foi a Cristina Peniche. Tinha 14 anos, e a seguir era uma escadinha até aos 20, que era eu que os tinha.

Neste início de 1975, o País vivia um trajeto revolucionário, com mudanças todos os dias e que depressa chegaria ao "verão quente" de 75, ponto alto do PREC (Processo Revolucionário Em Curso).Com o aparecimento de muitos partidos políticos, a sua influência crescente na sociedade emergente e, naturalmente, em cada um de nós, começou a não ser fácil aguentar a unidade, “marca d'água” do nosso caminho até aquela altura. Continuo a pensar, que aquele núcleo duro inicial, conseguiu manter a mesma dinâmica, porque se adaptou bem à nova situação e garantiu uma prática democrática muito abrangente do ponto de vista partidário. Conseguimos permanecer unidos, resistindo a todas as tentativas hegemónicas, muito embora as conhecidas e confirmadas ligações partidárias de alguns de nós.

Entretanto aproximava-se o Carnaval, altura de brincadeiras e passeios de mascarados e realização de bailarico na “sociedade”. Naquele ano de 1975, o pessoal da URCA pensou, projetou e apresentou, um programa mais elaborado que, para além de baile num dos dias, incluía, noutro dia, a apresentação em palco, de vários “quadros” de comédia ensaiados e representados pela “prata da casa”. O nosso problema era sempre o mesmo – local para fazermos isto. Já antes, tínhamos tido a colaboração do Sr Saraiva que nos disponibilizou um anexo da serração para fazermos um baile. Para o Carnaval fomos novamente falar com ele e o Senhor, com toda a boa vontade do mundo, ofereceu-nos um armazém ao lado da sua casa. Era o ideal, ficamos todos contentes mas estava cheio de madeira para ser retirada e, depois da festa, para voltar a pôr no mesmo sítio.

O Carnaval de 1975, primeira realização a sério da URCA, foi um grande sucesso. A população da Abrunheira participou em massa e isso deu-nos muita força para continuarmos. No entanto, era cada vez mais sentida a falta de instalações, não só para sede, mas principalmente, para se desenvolver uma actividade cultural e recreativa continuada e devidamente programada.
O País estava a mudar e nós não queríamos ficar para trás. Um pouco por todo o lado, tomava forma uma onda que viria a tornar-se imparável – tantas vezes levada ao exagero - que era, a ocupação de todo o imóvel que se encontrasse comprovadamente ao abandono. Como é natural, o fato de abordarmos a temática e de falarmos de alguns locais que poderiam servir para desenvolvermos os nossos projetos, levou a que a nossa indestrutível unidade até aí, sofresse algum abalo. Claro que era um assunto polémico e muitos de nós achavam que não deveríamos ir por aí. Como se veio a verificar, a unidade resistiu e, nos meses seguintes, iria tornar-se ainda mais forte.

Entretanto, chegamos a 3 de Março daquele ano do PREC. Era Segunda-Feira, apanhei o comboio da linha do Oeste de manhã cedo no Cacém, e lá fui até à Figueira da Foz “assentar-praça” no exército deste País. Tinha o estômago às voltas, não só pela obrigação de ir para a tropa, mas também porque na véspera, a festa da minha despedida na adega do Pai do Zé Carmo Silva, tinha sido de arromba e com muito álcool.

(Continua)
(Extraído dos textos “Abrunheira, Terra com História” de Silvestre Brandão Félix, publicados no extinto blogue “Aldeia Viva” durante 2007 e 2008.)
(Correção e atualização do autor em 2011)

Silvestre Félix

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

FUNDAÇÃO DA URCA - CAPÍTULO I - 2ª PARTE - ANTES DE 3 DE JANEIRO DE 1975

…………..
Não estávamos a inventar a “pólvora” e o facto de na Abrunheira não haver nenhuma forma de coletividade ativa, levou alguns de nós a participar em iniciativas culturais ligadas à Igreja Católica na paróquia do Algueirão. Nesta fase da vida do nosso País, as organizações juvenis católicas, eram muito dinâmicas e, duma forma geral, com uma prática anti-ditadura e progressista.
Durante dois ou três anos, seis, sete ou oito, rapazes e raparigas da Abrunheira, integraram esse grupo de Algueirão que promovia uma grande festa anual de homenagem aos Avós, com mobilização, acima de tudo ao fim de semana, de pelo menos uns seis meses. Para a época era uma coisa com peso a nível de Concelho.
A participação neste grupo deu-nos experiência de organização, de contornar a censura, iludir a pide e os seus informadores e muita vontade de fazermos coisas na Abrunheira.

Entretanto o primeiro trimestre de 1974 corria turbulento e, depois do 16 de Março, pairava a sensação que alguma coisa ia mudar. Chegamos ao glorioso dia 25 de Abril. Pelas sete da manhã, a minha Mãe chamou-me como de costume e diz-me: “que….enfim, era melhor não ir para Lisboa, porque estavam a dizer no rádio que havia por lá uma revolução.” Tal como se desprende uma mola, sentei-me na cama, liguei o rádio que tinha à cabeceira sintonizado no Rádio Clube Português (o antigo. Não tem nada a ver com o atual), mas só ouvia marchas militares. Perguntei à minha Mãe o que tinha ouvido, mas ela coitada estava mais baralhada que eu. A minha grande dúvida naqueles minutos, era se se tratava de um golpe de esquerda ou de direita, ou melhor, se contra ou a favor da guerra. As marchas militares não me agradavam, passavam-me uma ideia muito militarista, contrária, como se sabe, à minha filosofia de vida já naquela altura.
De repente, pararam as marchas e ouvi a voz inconfundível de Luís Filipe Costa lendo o célebre comunicado do MFA: "Aqui, posto de comando do Movimento das Forças Armadas…..etc, etc", que, dizia o que eu queria ouvir, os principais objectivos do movimento eram: Derrubar a ditadura, instaurar a democracia e acabar com a guerra colonial (na altura, habitualmente designada guerra do ultramar).


Levantei-me muito mais depressa que o costume, e, passando pela preocupação da minha Mãe a que se juntava também o meu Pai, lá fui apanhar a camioneta para Sintra. Bebi a bica no Cintya como o fazia diariamente e, antes de entrar no comboio que acabava de chegar à estação de Sintra, reparei que desembarcavam muitas pessoas que vinham com certeza de Lisboa como se fossem 7 horas da tarde. Então, fui atrás dum funcionário da CP, perguntei-lhe se ia haver comboios para o Rossio e ele disse-me que sim, só não sabia se depois havia de Lisboa para Sintra.
A curiosidade era muita e, além do mais, tinha o trabalho à minha espera pelo que, só tinha razões para fazer o mesmo dos outros dias e ir até à Capital.

Como todos sabemos, de normal o dia não teve nada, mas isso é outra história. Lá pelas sete da tarde de 25 de Abril de 1974 já estava na Abrunheira com os meus companheiros a trocarmos as histórias do Dia, e eu, com a edição actualizada do jornal "República" (Que guardo comigo até hoje), e a delinearmos a estratégia para o nosso grupo, agora em total e completa liberdade.
Passamos a noite de 25 para 26 a conversar, jogar king e a ouvir as notícias pela rádio na adega do Pai do Zé Carmo Silva. Tenho receio de ser injusto e não referir alguém, mas não errarei muito se disser que nessa noite, estivemos juntos, pelo menos, eu, o Zé Carmo Silva, Zé Marques, Fernando Marques, Mário Martinho e Rui Simplício. Tenho quase a certeza que havia mais gente mas, sinceramente, não consigo lembrar-me quem.

O ano de 1974 foi correndo com todos os acontecimentos que nós conhecemos, e, as nossas actividades foram evoluindo, agora, em democracia e com horizontes mais largos. O conceito de Associação foi crescendo, até que, depois do Verão de 1974, o que viria a ser a URCA estava feito. Fomos falando com o pessoal do futebol e, antes do Natal, estava tudo acordado. Faríamos a união do grupo de futebol existente com a componente cultural e o nome ficou logo acordado.

Fomos fazendo o trabalho de casa, passou o Natal, o Ano Novo e, no dia 2 de Janeiro de 1975, reunimos na casa dos Pais da Odete Santos. Estiveram presentes, creio, Silvestre Félix, Carmo Silva, Zé Marques, Fernando Marques, Mário Martinho, Zé Barros, Cristina Peniche, Fernanda Barros, Joaquim António (Quitó) e Odete Santos. É provável que estivesse mais alguém. Peço desculpa por qualquer omissão mas já passou muito tempo. Assistiram, porque estavam em sua casa, o Joaquim e a Julieta Santos. Nessa reunião combinamos todos os pormenores e ficamos prontos para o grande momento.

No dia 3 de Janeiro de 1975, reunimos uma grande Assembleia no local onde funcionava a sede do Grupo Desportivo e que se chamava "A Sociedade".

Foi declarada a criação da URCA-UNIÃO RECREATIVA E CULTURAL DA ABRUNHEIRA, e foram logo eleitos os Órgãos Dirigentes da nova Associação. Direção, Mesa da Assembleia Geral e Conselho Fiscal. Assinaram o livro de presenças, e, por consequência, passaram a ser Sócios fundadores, mais de 30 pessoas.

(Continua)
(Extraído dos textos “Abrunheira, Terra com História” de Silvestre Brandão Félix, publicados no extinto blogue “Aldeia Viva” durante 2007 e 2008.)
(Correção e atualização do autor em 2011)

Silvestre Félix
11.01.2011

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS DE SÃO PEDRO

Hoje, pelas vinte e uma horas, no Salão Nobre do Quartel dos Bombeiros de São Pedro em São Pedro de Penaferrim, realiza-se a cerimónia de tomada de posse dos Órgãos Sociais da ASSOCIAÇÃO HUMANITÁRIA DE BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS DE S. PEDRO DE SINTRA para o triénio 2011/2013, eleitos no passado dia 20 de Dezembro de 2010.
ASSEMBLEIA GERAL

Presidente: Silvano Manuel Santos Inácio Sócio nº 4693
Vice-Presidente: Iduino Manuel Nobre Vicente Sócio nº 1246
1º Secretário: Silvestre Brandão Félix Sócio nº 4275
Suplente: Miguel Nuno Pereira Forjaz Sócio nº 2403
DIRECÇÃO

Presidente: Joaquim Manuel Silva Duarte Sócio nº 3208
Vice-Presidente: João António Conceição Pereira Sócio nº 627
Vice-Presidente: António José Antunes Silva Valentim Sócio nº 4272
Vice-Presidente: Comandante do Corpo de Bombeiros
Tesoureiro: Ricardo David Palmeiro Abreu e Castro Sócio nº 5310
1ª Secretária: Ana Cristina Amada Correia Sócia nº 5276
2º Secretário: Jorge António Almeida Torres Sócio nº 3211
1º Suplente: Manuel Maria Nunes Sócio nº 4639
2º Suplente: Rafael Cabrita Martins Sócio nº 703

CONSELHO FISCAL

Presidente: João Alberto Rodrigues Peniche Sócio nº 3250
Vice-Presidente: Valentina Maria Azinheira Matoso Sócio nº 5081
Secretário Relator: António Augusto Batista dos Santos Bento Sócio nº 685
Suplente: Pedro Manuel da Costa Ventura Sócio nº 5268

Como se sabe, o novo Quartel está praticamente pronto e, muito em breve, assistiremos à sua inauguração podendo os Bombeiros de São Pedro ocupar a nova casa a que, há muito, tinham direito.

Silvestre Félix

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

FUNDAÇÃO DA URCA - CAPÍTULO I - 1º PARTE - ANTES DE 3 DE JANEIRO DE 1975

A propósito do 36º aniversário da fundação da URCA, inicio hoje a publicação de um texto, em dois capítulos (antes e depois de 3 de Janeiro de 1975) e, por sua vez, dividido em duas ou três partes cada.
«««««««««««««««««««««««««»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»»
O café do Cabaço, hoje fechado e com uma placa com o nome de “Almada”, era o nosso ponto de encontro. Era lá que se conversava, via televisão, lia as notícias, conspirava, namorava e também se comia, bebia, jogava matraquilhos e king, enfim, era a nossa segunda casa e, para alguns, quase a primeira.

Quando o Cabaço fechava, ainda subíamos o "curronquinho" (não sei a origem do nome nem se a palavra está bem escrita, mas era assim que chamávamos à rua que, mais tarde, seria batizada de “Ferreira de Castro”) e ficávamos à conversa, muitas vezes “subversiva”, na esquina da Ferreira de Castro com a MFA madrugada dentro, e sempre atentos a qualquer movimentação suspeita, a PIDE andava aí e não brincava em serviço.

O emprego frequente do pronome na primeira pessoa do plural (nós) é consciente. A intenção é passar uma ideia verdadeira de grupo que, de fato, existia. Éramos todos muito novos mas bastante responsáveis. Eu, era dos mais velhos e em 1974 tinha 20 anos. Não vou referir uma lista de nomes, porque posso ser injusto com alguém mas, não fugirei à verdade, se disser que os participantes nestas tertúlias, com mais ou menos assiduidade, constam nos fundadores da URCA.

No entanto, não posso deixar de destacar algumas pessoas da geração dos nossos pais que nos ajudavam a concretizar as nossas festas e realizações recreativas e culturais. O Saraiva da serração, que várias vezes nos emprestou as suas instalações para aí fazermos bailes ou programas de "variedades". O Cabaço e a sua esposa Silvina, que nos aturavam todos os dias, e, visto à distância, tinham muita paciência, o Joaquim Santos e a esposa Julieta que acompanhavam a filha Odete em reuniões do núcleo duro que, algumas vezes, foram feitas em casa deles.

O final de 1973 e o início do ano de 1974, já muito perto do 25 de Abril, foi um período bastante turbulento. Ainda em 1973 tiveram lugar as últimas pseudo-eleições promovidas pelo regime da ditadura, em que, muito embora tenham sido apresentadas listas de oposição, acabaram por desistir porque não conseguiam fazer campanha. Qualquer comício ou simples reunião promovida pela oposição, era invadida pela polícia com orientação da PIDE (nessa altura DGS). Um desses acontecimentos que conseguiu chegar ao conhecimento da generalidade dos Portugueses, foi a Convenção Democrática em Aveiro, em que os participantes eram em tal número, que a polícia+pide não conseguiu esconder, como sempre fazia.

O regresso de Spínola da Guiné e a publicação do seu livro “Portugal e o Futuro” em Fevereiro de 1974, o 16 de Março (levantamento militar do quartel das Caldas da Rainha) a ida da "Brigada do reumático" a S. Bento, discursos e contra-discursos, fazia com que andássemos um bocado agitados. Para temperar ainda mais o ambiente, chegava-nos todos os dias às mãos, propaganda contra a guerra colonial, contra o regime e a Pide, enfim, tudo o que o Governo da ditadura proibia e considerava propaganda comunista, anti-patriótica e subversiva.

Naquele final de 73 e princípio de 74, assisti várias vezes em Lisboa a investidas da polícia de choque. Ninguém queria ir para uma guerra, ainda por cima, para a Guerra Colonial que considerávamos injusta, não só para nós, como para os povos das antigas colónias. A Guerra Colonial era o motor mais visível da contestação ao regime, na população duma forma geral e dentro do regime, mas era uma realidade e eu, “assentaria praça” a partir de Janeiro de 1975, pelo que, não havia um dia, uma hora, que não me lembrasse disso.

No entanto, no meio de todas estas preocupações, a ideia de criarmos uma Associação de cariz cultural e recreativo na nossa Terra não esmorecia, pelo contrário, à medida que o tempo passava, mais se cimentava essa certeza.

(Continua)
(Texto corrigido e atualizado. Extraído da postagem de Silvestre Félix publicada no extinto blogue “Aldeia Viva” em 11 de Novembro de 2007)

Silvestre Félix
3 de Janeiro de 2011
Tags: URCA